Laura era menininha quando o pai se foi.
A dúvida não podia calar o que a criança sentia. Era falta de calor.
A pesquisa da universidade grã-fina respondeu que até pra macacos o carinho importa.
Eles mamam rapidamente e se chegam, mais logo ainda, aos trapinhos com cheiro de paz.
(...)
E eu acabei falando pra ela que não gostava quando ela pintava as unhas de vermelho. Cheguei a até mesmo rir quando ela disse que, além das mãos, as unhas dos pés também estavam naquela cor.
Cor de jovem, mãe! Foi o que eu falei. Não de uma senhora de 62! E ria e ria. E ela ria também. Acho.
Agora, ao vê-la ali, lívida, sem vida, de lábios arroxeados, sinto que meu silêncio seria de ouro, de outro.
Mas as mãos cruzadas, da minha querida, são brancas. E as unhas são de um carmim tão vivo que rimam com as flores que sempre enfeitaram.
(...)
Depois, estou no bar. Só. Mas bem assim é como eu quero ficar.
Vou limpar as coisas que ele deixou, por dentro, cada canto da casa. Mas, para isso, terei que aguardar a vontade chegar.
Por ora, deito e sinto o sol se pôr e nascer (pela fresta da persiana fechada) e a poeira se acumular. Minhas aranhas têm nome, minhas digitais já foram cobertas, por ali não passei mais sem pai.
O único desejo que vem é o de permanecer com a janela trancafiada, longe do sol, dos ruídos das gentes.
Não tarda, broto de baldes em riste, jogando água nesse lago parado de salgada saudade.
Por ora, permaneço.
(...)
Chega de procurar por quem não care.
2 comentários:
viajei no texto...me peguei com uns 20 anos a menos...numa aula de anatomia humana,(fui fazer um trabalho pra feira de ciências)e de vários corpos que ali se encontravam(e eu me perguntando qual seria a história que cada um carregava antes de vir a morrer...),a única coisa que ainda carrego na memória é a mão de uma defunta que tinha as unhas pintadas de vermelho carmim...
vc conseguiu fazer passar um filminho na minha mente!!!
bj
Ahaha! Incrível. Que cena. Rei Stephan aproveitava. :)
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